Depois de exumados, os restos mortais do ex-presidente serão recebidos na capital com honras militares. Governo acompanha a perícia, que terá auxílio de profissionais internacionais
Corpo será recebido com honras de chefe de Estado
O governo federal criou um grupo de trabalho para acompanhar a exumação dos restos mortais do ex-presidente João Goulart, a realização dos exames e as perícias necessárias, para apurar se ele foi assassinado por meio de envenenamento, em 1976, durante o exílio na Argentina.
Coordenado pelo perito da Polícia Federal Amaury de Souza Junior, a comissão é formada por representantes da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e da Comissão Nacional da Verdade. Eles chegarão a São Borja, na fronteira oeste do Rio Grande do Sul, na próxima segunda-feira. Na quarta-feira, será aberto o jazigo do ex-presidente, que está resguardado por uma tampa que pesa 500 quilos.
De lá, no mesmo dia, os restos mortais de Jango seguem para Santa Maria de helicóptero, onde os responsáveis por sua guarda passarão a noite. Na manhã seguinte, os despojos chegam a Brasília, onde fica a sede do Instituto Nacional de Criminalística, e serão recebidos com honras de Chefe de Estado. Os restos só retornarão a São Borja em 5 de dezembro, aniversário da morte do ex-presidente, passando antes por Porto Alegre.
Peritos da Argentina, Uruguai e de Cuba auxiliarão nas perícias. O cubano Jorge Perez Gonzalez está no grupo a pedido dos familiares do ex-presidente. Ele participou da exumação dos restos mortais do guerrilheiro argentino Ernesto Che Guevara e do venezuelano Simón Bolivar, considerado herói da independência das colônias espanholas sul-americanas. Conforme a portaria que instituiu o grupo de trabalho, o laudo oficial, que será produzido pelo Departamento de Polícia Federal, poderá ser acompanhado dos relatórios dos especialistas convidados, porém, como anexos.
Em Brasília, serão feitos exames de DNA e outra avaliações para verificar se realmente são de João Goulart. A área onde está o túmulo tem sido monitorada pela Brigada Militar do Rio Grande do Sul, segundo informou a Secretaria de Direitos Humanos. O ex-presidente foi enterrado em São Borja por determinação do governo militar brasileiro, sem que tenha sido feita autópsia do seu corpo.
Versão oficial
Oficialmente, Jango morreu de ataque cardíaco. Mas a suspeita é de que ele ingeriu veneno introduzido em uma cápsula do remédio que tomava regularmente para tratar de problemas no coração. Amostras serão enviadas em seguida a laboratórios internacionais, para verificar a possibilidade de identificar eventuais resíduos de substâncias que possam ter provocado a morte do ex-presidente.
João Goulart teria sido morto, na Argentina, onde se exilou, a pedido do governo militar brasileiro por agentes da ditadura uruguaia durante a Operação Condor, uma aliança político-militar que reuniu, na década de 70, os governos ditatoriais do Brasil, Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai, com ajuda norte-americana, para combater opositores dos regimes. A família sempre suspeitou da versão de ataque cardíaco, alegando que o ex-presidente estava se articulando para retornar ao Brasil e lutar contra a ditadura militar.
Para saber mais
Conspiração internacional
Empossado presidente da República em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros, de quem era vice, João Goulart foi deposto pelo golpe militar em 1964. Exilou-se com a família no Uruguai e depois na Argentina, onde morreu em 6 de dezembro de 1976, na cidade de Mercedes, aos 57 anos. O processo de exumação dos restos mortais do ex-presidente iniciou em 2007, quando os familiares do ex-presidente solicitaram a reabertura das investigações sobre sua morte ao Ministério Público Federal.
Eles se basearam nas revelações feitas por Mário Neira Barreiro, ex-agente da ditadura uruguaia, que cumpria pena em Porto Alegre de mais de 10 anos por contrabando de armas. Ele afirmou que Jango foi morto em uma operação orquestrada pelos regimes ditatoriais da América do Sul, com a ajuda da CIA americana.
Em 2010, o procurador da República no Rio Grande do Sul Júlio Schwonke de Castro Júnior arquivou o inquérito, descartando a tese de conspiração internacional para matar o ex-presidente, depois de analisar documentos secretos e ouvir testemunhas. O procurador justificou que a suspeita de assassinato se baseava unicamente em depoimento contraditório e confuso de Barreiro.
Em 2011, os familiares de Jango pediram a reabertura das investigações à ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Em abril de 2012, a Comissão Nacional de Verdade, criada em 2011, para apurar violações de direitos humanos praticadas entre 1946 e 1988, aprovou o processo de exumação dos restos mortais de Jango.
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